Nota política da Coordenação Nacional
do Movimento Luta pelo Socialismo (M-LPS)
O nível
de mobilização do dia 30 de junho suscita um debate sobre as relações
dialéticas entre a classe trabalhadora, suas organizações e partidos e as
direções “oficiais” do movimento operário. Várias correntes, partidos e
organizações apresentaram balanços e análises a respeito do recuo das Centrais
Sindicais e a mobilização menor neste dia.
O
objetivo desta nota é fazer uma breve reflexão sobre o papel das direções
majoritárias no amplo movimento da classe trabalhadora, em especial na classe
operária. E quais as táticas mais adequadas para enfrentar esta situação do
ponto de vista da construção de uma alternativa de luta contra o capitalismo e
que através da ação prática e discussão com a vanguarda abra caminho para a
luta pelo socialismo. Pensamos que este é um dos e talvez o principal desafio
da esquerda socialista.
Para a ajudar a reflexão proposta nesta nota política, tomamos “emprestado” o título de um texto de Trotsky,
“Classe, Partido e Direção”. Neste texto focado na Revolução Espanhola e na
guerra civil, ele analisa as causas da derrota do proletariado espanhol.
Não há como fazer analogias de situações políticas tão diferentes,
a Espanha da revolução socialista traída e da guerra civil com a situação
brasileira em 2017 onde o poder do Estado foi tomado de assalto por uma
quadrilha de “gangsters”. Mas mesmo assim aparecem um denominador comum que é
uma constante das revoluções proletárias na era de decadência do imperialismo.
Uma burguesia incapaz de estabelecer uma república burguesa democrática; um
proletariado que desperta para a luta de classe, pressionando para o
atendimento de suas reivindicações democráticas e econômicas; uma direção
reformista majoritária na classe trabalhadora que deseja manter o processo
revolucionário nos limites burgueses (a Frente Popular com a burguesia ou com
sua sombra); e finalmente uma Esquerda pulverizada e ainda incapaz de se constituir
em um polo alternativo, independente, em relação à política do reformismo.
Citamos um parágrafo deste artigo:
“A mesma penetração dialética é necessária quando
se trata da direção de uma classe. Imitando os liberais, nossos sábios aceitam
tacitamente o axioma de que cada classe tem a direção que merece. Na realidade,
a direção, de nenhum modo, é um simples "reflexo" de uma classe ou o
produto de sua própria criação livre. Forja-se a direção no processo dos
choques entre diferentes classes e das fricções entre as diferentes camadas
dentro de determinada classe. Uma vez assumido seu papel, a direção
invariavelmente se eleva acima de sua classe, com o que fica predisposta a
sofrer pressões e influências de outras classes. O proletariado pode
"tolerar" por longo tempo uma direção que tenha sofrido um processo
de completa degeneração interna, contanto que ela não tenha tido a oportunidade
de evidenciar essa degeneração diante dos grande acontecimentos. É necessário
um grande abalo histórico para aparecer a aguda contradição entre a direção e a
classe. Os abalos históricos mais poderosos são as guerras e as revoluções.
Precisamente por este motivo é que, com freqüência, a classe operária é pega
desprevenida pela guerra e pela revolução. Mas mesmo nos casos em que a velha
direção tenha revelado sua corrupção interna, a classe não pode improvisar
imediatamente uma nova direção, se não herdou do período anterior sólidos
quadros revolucionários, capazes de aproveitar o colapso do velho Partido
dirigente” (Classe, Partido
e Direção, Leon Trotsky, 1940).
Como as classes em luta se posicionam na arena
política
O dia 30 de junho, data marcada, pelas centrais sindicais,
para uma nova greve geral com o objetivo de barrar as contrareformas
reacionárias do governo Temer e que vem combinando com a campanha pelo Fora
Temer e Diretas Já, acabou sendo um dia de lutas, greves parciais por todo o
país, paralizações, manifestações, ocupações de ruas, mobilizando o setor mais
consciente da classe trabalhadora e da juventude. Foi um importante dia de luta
atingindo mais de 100 cidades em todo o Brasil. Uma nova Greve Geral precisa
ser preparada, o que não ocorreu por conta principalmente da ambiguidade da
CUT, a principal central sindical, diferentemente da Greve Geral de 28 de abril
que teve ampla mobilização prévia e que ganhou a adesão das amplas massas
populares.
Mas houve cidades em que a greve dos transportes públicos
contribuiu para uma paralização total, como em Brasília e em algumas capitais
do Nordeste. Mas como regra geral as paralizações se deveram às categorias com
maior tradição de luta e as manifestações Uma abordagem impressionista é a que
vamos encontrar na mídia alternativa onde não faltam vozes a dizer que “as
Diretas já e o Fora Temer” não pegaram na população ou que “as massas estão
apáticas”. De outro lado os esquerdistas afirmando que “as massas estão desconfiadas” e quando são chamadas a
se mobilizarem pelas Diretas Já elas não correspondem.
Massas “apáticas” ou “desconfiadas” não fazem uma greve geral
que paralizou 40 milhões de trabalhadores. Greve de massas onde a espontaneidade
foi o aspecto mais positivo no dia 28 de abril. Greve de massas que
intensificou a divisão e crise de domonação da burguesiaq e de seu governo
corrupto. Greve de massas que exigiu o fim das contrarreformas, mas também o
Fora Temer e colocaram na agenda as Diretas Já!
Não sejamos simplistas. A questão deste “refluxo” parcial
ocorrido no dia 30 de junho está determinada pela relação dialética entre a
classe trabalhadora, em especial a classe operária e suas direções.
A economia e o projeto reformista
O Partido dos Trabalhadores fez recentemente o seu 6°
Congresso. Em uma de suas intervenções, Lula declara que “2018 está logo ali”.
Nesta simples frase se resume toda política do PT: se preparar para as eleições
de 2018 onde Lula é o favorito em todas as simulações das pesquisas. E o
projeto do PT não será de um governo que preconize uma saída pela esquerda, o
que se delineia é um governo de coalizão com a “sombra da burguesia”, isto é,
um governo de “Frente Popular”, com um programa de salvação da economia
capitalista com concessões sociais, conforme está na “Programa Popular de Emergência”
defendido pela Frente Brasil Popular.
A direção reformista (Lula, PT, PCdoB) vai tentar um novo pacto de
colaboração de classes com a burguesia tendo como passaporte a “sombra” dela
(Roberto Requião, Ciro Gomes, Luis Carlos Bresser Pereira, etc.) além da
participação de setores da própria burguesia sempre vistos como “progressistas”
pelo reformismo. A adoção de medidas “keynesianas” (referência ao economista
inglês John Maynard Keynes) cuja teoria atribuiu ao Estado o direito e o dever de conceder benefícios sociais
que garantam à população um padrão mínimo de vida como a criação do salário mínimo, do seguro-desemprego, da redução da jornada de trabalho (que então
superava 12 horas diárias) e a assistência médica gratuita. O Keynesianismo
ficou conhecido também como "Estado de bem-estar social".
Será possível aplicar este programa na situação onde o capitalismo
mostra a sua face em decomposição através da massiva crise global de
superprodução que parece não ter fim? O governo “socialista” de Portugal está
aplicando essas políticas às custas de um aumento gigantesco da dívida pública.
Logo vai estar confrontado com o dilema: ou nacionaliza os bancos e o capital
financeiro ou será obrigado a capitular perante as medidas de austeridade.
Como será possível um hipotético governo Lula de coalizão aplicar no
prazo de 4 anos 25% do PIB em investimentos públicos para recuperação da
capacidade produtiva do capitalismo sendo que a dívida pública brasileira já
chegou a 3,650 trilhões para um PIB estimado de 4 trilhões?
Esta será uma das grandes contradições que o reformismo irá enfrentar se
chegar novamente ao poder. Mas tem a vantagem de defender perante os
trabalhadores o “Estado de Bem-Estar Social” perante as medidas aplicadas com
toda selvageria pelo governo ilegítimo de Temer e sua quadrilha.
O que deu um novo alento ao reformismo quando alguns o consideravam “morto”
e só faltava sepultá-lo? O impeachment, a voracidade dos ataques da burguesia
como o novo governo e a perseguição midiática á toda esquerda e principalmente
a Lula e ao PT, criou o cenário para suscitar novas ilusões nas massas
recuperando parte significativa do prestígio de Lula e do PT. Mas fica a
pergunta: será bem-sucedido? Praticamente impossível!
O chamado neoliberalismo ou melhor dizendo, a política de “auto-regulamentação
do mercado” fracassou em todos os países e por outro lado o “keynesianismo” com
suas meias medidas, e ao não avançar em direção a abolição da ordem existente e
da propriedade privada dos grandes meios de produção fracassará igualmente.
O jogo duplo do reformismo
O assalto ao poder liderado pelo PSDB-PMDB que instalou na Presidência
da República o corrupto Temer – com o objetivo de impor contrarreformas
reacionárias de retirada de direitos trabalhistas e previdenciários - desencadeu
uma crise política de tal proporção que a burguesia não sabe agora como sair
dela. A classe trabalhadora reagiu e depois de uma série de manifestações
desencadeou a maior greve geral já ocorrida no Brasil desde a greve de 1917. As denuncias de corrupção todo o governo Temer,
seus partidos aliados no Congresso e o próprio Temer atingido em cheio na
condição de chefe de quadrilha de criminosos.
A burguesia se dividiu em várias facções, não consegue compor
um governo via eleição indireta e o único consenso que as facções burguesas tem
é o de, com Temer ou sem Temer, as contrarreformas têm que ser aprovadas, mesmo
que isso signifique afundar a economia brasileira no mais completo lodaçal.
E a única força política neste momento com apoio popular,
capaz de eleger um governo é o PT e Lula, com o projeto reformista da “Frente
Popular”. Depois de ter sido satanizado pela Lava Jato, pela mídia e pela
burguesia, Lula reaparece com 30% a 40% das intenções de votos.
Assim vai ficando claro que toda a política aprovada no 6°
Congresso do PT consiste em jogar todo peso da mobilização para as eleições de
2018. Apesar de formalmente apoiarem as “Diretas Já”, o que fica evidente é
usar esta mobilização como demonstração de força perante uma burguesia que,
apesar de contar com grandes recursos financeiros, está sem uma base política homogênea
e neste momento, eleitorado insuficiente para fazer frente a candidatura Lula.
O reformismo faz então um duplo jogo acenando para a
burguesia que tanto tem capacidade de mobilizar tem também a capacidade de
freiar e desmobilizar. O reformismo quer se qualificar para um novo pacto de
colaboração de classes.
Classe e partido: a luta pela construção de uma
direção revolucionária.
A classe trabalhadora brasileira despertou do longo
entorpecimento provocado pela política de colaboração de classes do reformismo
com a burguesia. O impacto da crise social no Brasil e os ataques da burguesia
para a retirada de direitos mexeram com as diversas camadas da classe
trabalhadora, das mais avançadas até às massas mais atrasadas.
Quando a classe trabalhadora vai à luta a sua consciência
espontânea se volta em direção às organizações tradicionais operárias que ela
experimentou no passado. Não poderia ser de outro jeito. A classe não improvisa
novas direções. Portanto é perfeitamente normal que as massas de trabalhadores
tenham fortes ilusões em Lula e no PT. Somente a experiência na luta de
classes vai mostrar às massas a inutilidade do programa reformista.
É necessário combinar as táticas adequadas para que as massas
façam a experiência com o reformismo e a colaboração de classes combinando as
reivindicações democráticas transitórias com as tarefas socialistas e neste
movimento apresentamos outro programa, resguardando as posições políticas
revolucionárias e explicando os limites do reformismo. E sobretudo para não cair no subjetivismo de querer uma revolução
apenas pela vontade de uma vanguarda sem as massas, é uma política
estéril e levará a desmoralização e marginalidade frente ao amplo movimento da
classe trabalhadora.
Lênin é muito claro sobre isso:
“A lei fundamental da revolução, confirmada por
todas as revoluções, e em particular pelas três revoluções russas do século XX,
consiste no seguinte: para a revolução não basta que as massas exploradas e
oprimidas tenham consciência da impossibilidade de continuar vivendo como vivem
e exijam transformações; para a revolução é necessário que os exploradores não
possam continuar vivendo e governando como vivem e governam. Só quando os
"de baixo" não querem e os "de cima" não podem continuar
vivendo à moda antiga é que a revolução pode triunfar. Em outras palavras, esta
verdade exprime-se do seguinte modo: a revolução é impossível sem uma crise
nacional geral (que afete explorados e exploradores). Por conseguinte, para
fazer a revolução é preciso conseguir, em primeiro lugar, que a maioria dos
operários (ou, em todo caso, a maioria dos operários conscientes, pensantes,
politicamente ativos) compreenda a fundo a necessidade da revolução e esteja
disposta a sacrificar a vida por ela ; em segundo lugar, é preciso que as
classes dirigentes atravessem uma crise governamental que atraia à política
inclusive as massas mais atrasadas (o sintoma de toda revolução verdadeira é a
decuplicação ou centuplicação do número de homens aptos para a luta política,
homens pertencentes à massa trabalhadora e oprimida, antes apática), que reduza
o governo à impotência e. torne possível sua rápida derrubada pelos
revolucionários”. (Lênin Teses de Abril)
Tudo depende do proletariado, de seus partidos e de sua
direção. Cabe à Esquerda Socialista, e o PSOL pode cumprir um papel essencial, abrir uma alternativa independente para a crise social e a catástrofe que
nos ameaça, respondendo à hegemonia do reformismo com a política da Frente
Unica, a linha da unidade entre as organizações operárias em defesa das
reivindicações. É a linha de chamar os reformistas a romperem com a burguesia. Nenhuma
força política atrelada à propriedade privada dos meios de produção e à ordem
existente pode abrir uma saída progressiva para a crise.
A unidade da Esquerda Socialista, que – armada com a
estratégia da revolução permanente é capaz de combinar, por meio das reivindicações
transitórias as reivindicações econômicas e democráticas (eleições diretas e
gerais já, Assembleia Constituinte, retirada das leis de exceção) com as
tarefas socialistas da revolução – será capaz de construir uma nova direção
para o movimento operário.
São Paulo, 7 de julho
de 2017
Coordenação Nacional do Movimento
Luta Pelo Socialismo M-LPS
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